Cazuza- Carta aberta às críticas
Assim que publicamos a notícia da vinda do musical de Cazuna à Natal, no final do mês, o blog recebeu uma carta aberta do advogado Wandenir Xavier em defesa “do grande poeta num exercício singelo do mister de advogado “ad hoc”, fazendo uso da própria obra dele”.
Por concordar com o texto, o blog publica na íntegra o texto.
Certa feita, um desses “intelectuais de protesto” fez severas críticas ao músico Cazuza, desrespeitando inclusive a família do mestre, na vã tentativa de macular a obra daquele gigante músico, compositor, cantor, artista.
Em primeiro lugar, não quero crer que se Cazuza ainda fosse vivo, entre nós, como um de nós, houvesse a altivez por parte deste reles mortal em tornar pública suas mágoas, parte enrustida de uma pessoa certamente mal amada – que sequer deve conhecer a doce e inigualável alegria do amor -, revelada pela pose de vestal em que tenta se colocar, promovendo injustas críticas em desfavor de um ser indefeso.
Talvez este gesto se dê muito mais por respeito do que por pequenez – sobretudo frente ao grande poeta -, uma vez que, como se diz no provérbio popular, “falar pelas costas representa respeito”, ou quem sabe mesmo pequenez ou, ainda, sentimentos outros, próprios dos covardes, indigno de aqui serem revelados.
Bem, vamos, aqui, em poucas palavras, fazer um breve escorço da obra do grande poeta.
Inicialmente, cumpre demonstrar que Cazuza nunca escondeu que era um verdadeiro “exagerado”. Aliás, invariavelmente isto ocorre com os grandes mestres das artes da humanidade, por viverem dentro dos seus próprios padrões, éticos e disciplinares.
Wolfgang Amadeus Mozart, dentre outros, confirma a assertiva acima, até porque também morreu em tenra idade por falta de desvelo para com sua própria saúde.
O certo é que Cazuza sempre procurou uma “ideologia” para viver.
E a encontrou.
Tornou-se músico invejável, caminhando sozinho, com seus próprios pés, desprezando a ajuda até mesmo dos seus pais, especialmente do seu pai, que o queria vê-lo dirigindo os negócios da família. Depois deixou sua própria banda seguindo sozinho carreira solo.
Ora, não é a história se repetindo, com outros personagens, como prenunciou o artista?!: “Eu vejo o futuro repetir o passado…”.
É sim.
No entanto, Cazuza era diferente – como são diferentes todos os gênios -, e não permaneceu preso aos marasmos impostos pela sociedade, de parcela fortemente hipócrita, que, por inanição intelectual, não tem coragem de quebrar paradigmas.
Essa ideologia foi perseguida sempre através de “todo amor que houver nesta vida”, procurando-a em todos os lugares, até mesmo nas fontes escondidas, como forma de encontrar motivo e alegria para viver, prelúdio da felicidade.
Cazuza sempre adorou amores inventados, preferindo até mesmo morrer de fome ou, quiçá, deixar de respirar, caso não viesse ser correspondido.
Cazuza era um ser puro, simples, desprovido de maldade e que viveu à frente do seu tempo, espalhando o néctar do amor, à sua moda. Sua pureza pode muito bem ser comparada a de um cuitelinho, colibri – Beija-flor, que esparge centelhas divinas por sobre as flores para tornar o mundo e nossas vidas ainda mais coloridas, belas e felizes.
Num rompante poético, poderia muito bem ter sido este seu “codinome: Beija-flor”, nem que somente fosse pronunciado dentro de algumas “orelhas frias”, sensíveis ao mais puro amor, como de uma mãe, por exemplo, ou de uma companheira amada e querida.
Falar mal de Cazuza ou negar sua obra é pretender apagar nossa própria juventude.
Qual de nós não cometeu algumas loucuras, esquecendo que “o tempo não pára” e que mais adiante poderíamos nos arrepender, do que tenhamos feito ou – o que é ainda pior -, do que tenhamos deixado de fazer?!
Disse, certa feita, um sábio a um conviva que lhe argüiu: “Mestre, devo casar?
Veio a resposta:
“Que quer que façais haveis de vos arrepender”!
É preferível se arrepender em razão dum gesto comissivo e não omissivo.
Cazuza não foi omisso.
Cazuza fez.
Ele enfrentou tudo isto, mesmo de forma intuitiva, porque certamente trazia gravado no imo do seu ser o destino do seu legado – Servir à Humanidade.
Serviu e muito, sim.
Ou por acaso não é verdade que aprendemos também com os erros dos outros, ou, pelo menos, com o que consideramos errado neles? Não é melhor tirarmos proveito de alguns equívocos eventualmente cometidos pelo grande poeta e corrigirmos falhas gritantes de personalidade, verdadeiros e inconfessáveis desvios de caráter ou – o que é pior -, toda maldade que possamos efetivamente encontrar em nós!?
Lógico que é bem melhor e mais fácil!
Encontrar defeitos nos outros, ou melhor, apontar defeitos nos outros, só vale verdadeiramente a pena se for para corrigirmos em nós.
Corriges em ti o que condenas em mim (Emmanuel).
Isto nos remete a Jesus Cristo: “Aquele que estiver sem pecado, atire a primeira pedra”. Aquele gesto divino salvou Maria de Madalena do apedrejamento, uma das penas capitais da época.
Não faço aqui apologia dos equívocos que possam ter sidos cometidos por Cazuza.
Faço exortação de sua obra poética e do legado que deixou para todos nós.
Quem, ao menos na adolescência, não gostaria de ter dito à sua musa, amada, mulher… “Te pego na escola e encho a tua bola com todo o meu amor Te levo pra festa e testo o teu sexo com ar de professor
Faço promessas malucas tão curtas quanto um sonho bom
Se eu te escondo a verdade, baby, é pra te proteger da solidão…”.
Depois de tudo isto dito pelo poeta, fica extremamente fácil ser repetido pelo simples mortal.
Era o que queria Cazuza. Tornar as coisas simples.
Isto sim “fazia e faz parte do show” dele.
Portanto, não há o que dizer sobre este crítico feroz a não ser calar e revelar apenas que somos irmãos em humanidade e que devemos ser tolerantes uns com os outros, sem que isto represente o silêncio omisso do criminoso, mas a reflexão do sábio.
Noutro passo, não se pode perder de vista que “é preferível a mentira que vivifica, que a verdade que mata!!!”.
Cazuza, para ele, viveu a verdade de uma vida real, autêntica, pondo em risco única e exclusivamente sua incolumidade física.
O “modus vivendi” pode tê-lo levado à morte, mas que jamais o levou a ser maldoso ou desrespeitoso para com o próximo.
Afinal, foi ele quem preconizou: “Vida louca vida, vida breve já que eu não posso te levar quero que você me leve…”.
Por derradeiro, não devemos nos deslembrar que o grande poeta deixou familiares, ainda vivos entre nós, que merecem respeito e não podem ser penalizados por nenhum ato praticado pelo parente, até porque Cazuza não cometeu crime algum com sua magnífica obra.
Com efeito, desde muito tempo que o Direito Penal Positivo das nações, ao menos em sua grande maioria, deixou de estender aos familiares as penas impostas aos faltosos, como nos revela Cesare Beccaria, no seu clássico “Dos Delitos e das Penas”.
Assim sendo, mesmo fosse Cazuza um faltoso, quanto à sua maneira de viver, sua obra apoteótica seria bastante suficiente para absolvê-lo!!!
Por acaso, não cobre o “amor” uma multidão de pecados?!
Deixar passar “in albis” as acusações levianas impingidas ao poeta, seria permitir houvesse perpetração da pena restritiva de liberdade, emocional e moral, máxime aos parentes do incauto, o que não se pode admitir nem ao menos por hipótese, por mais remota que seja, por tudo dito e feito pelo grande poeta, aqui comentado em breves palavras.
Por estas razões, mesmo destituído de instrumento procuratório, faço a defesa do grande poeta num exercício singelo do mister de advogado “ad hoc”, fazendo uso da própria obra dele.
Waldenir Xavier de Oliveira
Advogado-Natal/RN