RN enfrenta surto de esporotricose
Por José de Paiva Rebouças
Especialistas estão preocupados com o crescente número de pacientes e animais infectados com a esporotricose, doença emergente provocada por fungos do gênero Sporothrix. Ao menos 131 pessoas foram diagnosticadas no Rio Grande do Norte, e um óbito foi confirmado. Até recentemente, não havia registro dessa micose por aqui. Hoje, ela se espalha muito rápido por Natal e região metropolitana, principalmente Parnamirim, Extremoz e São Gonçalo do Amarante, mas já foi identificada em Santo Antônio do Salto da Onça.
Epidêmica no Sul, Sudeste e Centro-Oeste, tendo o maior número de casos confirmados no Rio de Janeiro, a esporotricose começou a dar sinais por aqui em 2015, quando o médico veterinário José Flávio Vidal Coutinho, do Centro de Controle de Zoonoses (CCZ) de Natal, levantou a possibilidade de alguns animais, principalmente gatos, apresentarem ferimentos e sintomas suspeitos.
A confirmação foi feita pelo Instituto de Medicina Tropical (IMT/UFRN), a partir de estudos de pesquisa científica do biomédico Thales Domingos Arantes — atualmente professor no Instituto de Patologia Tropical e Saúde Pública IPTSP/Universidade Federal de Goiás — em colaboração com a bióloga, geneticista e supervisora do Laboratório de Micologia do IMT/RN, Raquel Cordeiro Theodoro, do Departamento de Biologia Celular e Genética do Centro de Biociências da UFRN. Em humanos, o primeiro caso foi diagnosticado pela infectologista Eveline Pipolo Milan, do Departamento de Infectologia da UFRN, em outubro de 2016.
Apesar de não haver registros dessa doença no RN até então, pesquisadores já sabiam que a região Nordeste apresentava aumento no número de casos desde 2013, sendo os estados mais afetados a Bahia, Pernambuco e Paraíba. Embora tenha demorado, a doença chegou aqui com muita força. Até agora, a espécie de fungo mais comum encontrado é a Sporothrix brasiliensis, de perfil zoonótico e associado a surtos de esporotricose.
Segundo Thales Arantes, por ter maior patogenicidade, essa espécie de fungo causa lesões mais graves e se prolifera em menor tempo quando comparada a outras, principalmente nos animais. “É importante o controle da esporotricose porque com um gato doente no ambiente doméstico, muito provavelmente, você e/ou algum membro da família irão contrair esporotricose também. As chances são de pelo menos 70%. Por isso, quanto mais rápido o diagnóstico e início do tratamento, menor será a dispersão do fungo no ambiente”, afirma o pesquisador.
O problema maior pode estar nos animais abandonados. Estima-se que pelo menos 150 mil felinos vaguem sem dono pelas ruas do estado, e isso é um sinal de que é muito difícil evitar a proliferação dessa micose. Até agora, 117 gatos foram diagnosticados pelo IMT com a doença, de 195 amostras enviadas, mas certamente o número e muitas vezes maior. “O controle da doença está intimamente ligado ao controle dos gatos”, reforçou Eveline Pipolo.
A médica aponta três preocupações em relação ao surto dessa doença. A primeira delas é o desconhecimento. Apesar de não ser nova no Brasil, é muito recente no RN e muitos médicos daqui a desconhecem. A demora no diagnóstico pode, inclusive, ter sido a responsável pela única morte registrada até agora. O período de incubação da esporotricose é variável, de uma semana a um mês, podendo chegar a seis meses após a inoculação, ou seja, entrada do fungo no organismo.